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JFRS condena União a pagar indenização a mulher que sofreu perseguição política durante ditadura militar

18/09/2019 - 11h57
Atualizada em 18/09/2019 - 11h57
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A 10ª Vara Federal de Porto Alegre (RS) condenou a União a pagar R$ 80 mil de indenização por danos morais a uma mulher em função da perseguição política sofrida durante o período da ditadura militar. A sentença, publicada no dia 6/9, é da juíza Ana Maria Wickert Theisen.

A autora ingressou com a ação narrando que, em 1964, ingressou na resistência política estudantil, passando a ser perseguida por motivação exclusivamente política. Informou que sofreu prisão arbitrária, em 1972, e processo penal militar, sendo absolvida quatro anos depois. Sustentou que, desde 1965, era professora estadual, mas o vínculo laboral foi encerrado em 1973.

Segunda ela, precisou buscar exílio na Bélgica em 1977, retornando ao país somente com o advento da Lei da Anistia. Apresentou a portaria do Ministério da Justiça que reconheceu sua sujeição a atos de exceção por motivação exclusivamente política, incluindo a quebra de vínculo laboral de assistente social exercido junto à Sudene. Entretanto, para ela, este reconhecimento não alcançou a perda do vínculo de professora do Estado do Ceará e nem os danos morais causados.

Em sua defesa, a União alegou a prescrição quinquenal. Afirmou que o requerimento da autora foi analisado pela Comissão de Anistia que concluiu não estar comprovada a perda do cargo de professora por motivação política, tendo a reparação concedida abranger danos morais e materiais.

Ao analisar o caso, a juíza federal substituta Ana Maria Wickert Theisen pontuou que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça definiu que "a prescrição quinquenal não se aplica aos danos decorrentes de violação de direitos da personalidade - que são imprescritíveis - ocorrida no período da ditadura militar, quando os jurisdicionados não podiam buscar a contento as suas pretensões". Entretanto, ela destacou que a "imprescritibilidade ampara tão somente a pretensão de indenização pelos danos morais. Quanto ao pedido de revisão dos valores concedidos pela Comissão de Anistia, não se aplica o mesmo entendimento".

Diante do conjunto probatório, a magistrada examinou o impacto da perseguição na vida da autora para possibilitar a quantificação da indenização devida, já que a intensa perseguição sofrida foi reconhecida pela Comissão de Anistia. Em depoimento, a mulher informou que permaneceu presa cerca de 25 dias, não foi agredida fisicamente, mas foi mantida em um cubículo com apenas uma cadeira e sofreu tortura psicológica, com sucessivos interrogatórios, onde faziam ameaças a seu pai. Após as perdas dos cargos públicos, conseguiu emprego, mas desistiu em função dos efeitos da repressão inclusive ali.

Segundo a mulher, sua vida era controlada. Começou a cursar o mestrado, mantendo-se com uma bolsa de estudo, mas, com medo de ser presa novamente por qualquer motivo ou até mesmo ser morta, acabou saindo do país.

"Por força da repressão política, além da prisão (o que de per si já justifica intenso dano moral), a demandante teve sua vida drasticamente alterada, sendo frustradas todas as suas expectativas profissionais. Ainda, viu-se alijada do convívio dos seus e do direito de permanecer em sua terra natal, pois o exílio foi o único meio encontrado para fugir da repressão", ressaltou.

De acordo com Ana Maria, configurado o dano, é preciso quantificar a indenização observando critérios subjetivos, de acordo com os atos cometidos pelo Estado, pois os danos psíquicos não são mensuráveis. Segundo ela, a fixação do valor deve considerar o tempo que a autora ficou presa, a perda dos cargos que mantinha junto à Secretaria Estadual do Governo do Ceará e à Sudene, a dificuldade da mulher encontrar trabalho em função de sua situação política, o que levou a buscar auxílio e, por fim, que não sofreu tortura física.

A magistrada julgou parcialmente procedente a ação condenando a União ao pagamento de R$ 80 mil. Cabe recurso da decisão ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.