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Justiça Federal determina monitoramento de resíduos de carvão da Termoelétrica de São Jerônimo (RS)

15/04/2021 - 14h45
Atualizada em 15/04/2021 - 14h45
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A 9ª Vara Federal de Porto Alegre sentenciou uma ação civil pública relacionada ao risco de dano ambiental causado pelos dejetos de cinzas de carvão da Usina Termoelétrica de São Jerônimo, bem como do uso deste material na construção de um porto fluvial no Rio Jacuí e na RS 401. A sentença, publicada nesta quarta (14/4), é do juiz federal Marcelo De Nardi.

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente contra a contra Empresa de Portos do Brasil S/A (Portobras), Estado do Rio Grande do Sul (E.RS), e Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) em 1987, baseado em denúncia feita pela Associação Canoense de Proteção ao Ambiente Natural (Ascapan). Os principais fatos denunciados eram a construção de um porto junto ao Rio Jacuí, nas imediações da Termoelétrica de São Jerônimo,  à base de um aterro feito com cinzas de carvão; o despejo indiscriminado, pela CEEE, de cinzas do carvão queimado na termoelétrica em toda a área que circunda a Usina; e a construção da RS 401 sobre  aterro de cinzas de carvão, cortando uma extensa área alagada em contato direto com o Rio Jacuí.

O MPF pediu, à época, que fosse determinado: a) à PORTOBRÁS, desfazer o porto questionado, retirando todas as cinzas de carvão depositadas no lugar da obra; b) ao Estado do RS, desfazer a estrada que construiu usando como aterro cinzas de carvão e que vai desde São Jerônimo a Cachoeirinha, providenciando na retirada daquelas cinzas das margens e, onde for o caso, do leito do rio Jacuí; e c) à CEEE, não mais depositar as cinzas do carvão queimado nas usinas termoelétricas nas cercanias do leito do rio Jacuí ou em lugares sujeitos a alagamentos, bem como a proceder à imediata retirada de todas as cinzas de carvão já depositadas em tais áreas. Também foi requerida a indenização em dinheiro pelos danos causados ao meio ambiente, na proporção de suas respectivas responsabilidades, revertendo tais somas para o então "Fundo de Reconstituição de Bens Lesados".

Ao analisar o caso, o juiz federal Marcelo De Nardi observou inicialmente que para que os pedidos fossem considerados procedentes, seria necessário demonstrar dano ambiental concreto ou do risco de dano, "configurado na presença de metais pesados nas cinzas e no líquido lixiviado, com potencial de contaminação das águas superficiais, do nível freático livre subterrâneo e de aquíferos subterrâneos", e em razão da conduta dos réus. Ele considerou estar comprovado que as cinzas em questão são classificadas como resíduos não-inertes, ou seja, substâncias que, através de processos de solubilização ou lixiviação contaminam com metais pesados e outros produtos nocivos, a saúde humana, as águas superficiais e subterrâneas e o meio ambiente como um todo.

Entretanto, haveria divergência quanto à presença indícios de contaminação da área, possivelmente em razão de parâmetros diversos de análise dos dados, tanto nas perícias realizadas pela FEPAM, quanto dados apresentados por ambas as partes. "A prova é predominantemente contrária à persistência de danos ambientais graves e, no que se refere a danos ambientais passados, indica não ser possível creditar qualquer contaminação ambiental exclusivamente ao depósito de cinzas aqui examinado", explicou o magistrado.

De Nardi concluiu que, apesar de não comprovado dano ambiental, a documentação juntada ao processo aponta que o material se encontra estabilizado, e inclusive já existe vegetação crescendo por sobre os depósitos de cinzas. Por outro lado, há risco de contaminação do meio ambiente se houver intervenções no local.

Os próprios conselheiros técnicos do MPF atualmente são contrários à petição inicial, e recomendaram que não se removessem as cinzas daquele local, pois a entrada de veículos e equipamentos, e o revolvimento desse material - já estabilizado - estariam aumentando a possibilidade de carreamento dos resíduos pela chuva ou pelas cheias.

O magistrado pontuou que os princípios ambientais da prevenção e da precaução impedem a ordem de desfazimento da estrada, a remoção de todas as cinzas de carvão depositadas no lugar do porto e da rodovia, julgando improcedentes estes pedidos.

Com relação ao porto fluvial, o interesse processual pelo seu desfazimento do porto desapareceu, os equipamentos não mais existem e o porto foi arrastado pelas cheias do rio Jacuí.

Em relação ao pedido principal dirigido contra a ré CGT Eletrosul (sucessora da CEEE), constitutivo da obrigação de não mais depositar as cinzas do carvão queimado, já havia sido deferido em sede liminar em junho de 1987. O juiz manteve a liminar, homologando o reconhecimento pela ré CGT Eletrosul da procedência do pedido neste ponto.

Já no que diz respeito à indenização por danos ambientais, não teria ficado comprovado que houvesse contaminação evidente, "pelo menos não no extenso e grave nível apontado pelo autor civil público, tampouco mensurável ao ponto de se aplicar o conceito de comunidade privada do ecossistema" afirmou De Nardi. O juiz concluiu que não haveria razão para imputar indenização aos réus, por falta de elementos claros para que se tenha por evidenciado dano à coletividade por conta do depósito de cinza.

A ação foi julgada parcialmente procedente, sendo negado o pedido de indenização, prejudicado o pedido de desfazimento do porto, e determinado que a ré CGT Eletrosul continue realizando o monitoramento da área.

Cabe recurso ao TRF4.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº 5064266-69.2018.4.04.7100/RS